quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Tráfico de pessoas na PB: crise econômica faz aliciadores mudarem rota da Europa para o Sul do país


Os jovens continuam a ser enganados pelos aliciadores que agora escolheram o Paraná como principal destino para ganhar dinheiro com a exploração de pessoas através da prostituição.
12Marinho Mendes
A crise econômica na Europa e as ações da Justiça da Paraíba fizeram com que aliciadores de jovens, que atuavam em municípios da região do Brejo da Paraíba, mudassem sua rota. Eles teriam deixado o tráfico internacional de pessoas, para buscar novos 'mercados' aqui mesmo no Brasil.

Os jovens continuam a ser enganados com sonhos de dinheiro fácil e riqueza pelos aliciadores que agora escolheram o Paraná como principal destino para ganhar dinheiro com a exploração de pessoas através da prostituição. As informações foram repassadas pelo promotor de Justiça Marinho Mendes, que iniciou em 2005 essas investigações. Foram essas investigações que  levaram à denúncia crime contra seis pessoas por tráfico internacional de pessoas. Elas eram levadas do interior da Paraíba para serem exploradas na Itália.

"Informações estão nos chegando que houve uma inibição desse tipo de crime depois das investigações, mas a ação dos traficantes não acabou. Eles agora estão procurando outras rotas, e o Paraná, por ter muitos descendentes de estrangeiros e ser um estado considerado rico, está sendo a mais nova rota desses criminosos", revelou Marinho.

O promotor revelou ainda detalhes da investigação que fez e que levou à denúncia em 2010 de Isnard Alves Cabral, José Fernandes Gorgonho Neto, Sérgio Inocêncio da Costa, Luciano de França Costa, José de Arimatéia Farias Duarte Júnior e do italiano Paolo Simi pelo Ministério Público Federal. Segundo a denúncia do MPF, o grupo atuava desde 1999 nos municípios de Araçagi, Mulungu, Guarabira e Rio Tinto, todos localizados no Brejo paraibano, a menos de 80 quilômetros da capital.
Marinho disse que foram aproximadamente 60 jovens paraibanos, entre 18 e 25 anos, que embarcaram levados pela rede de aliciadores e traficantes para a Itália. Os aliciadores recebiam por cada jovem 50 mil euros, que cobriam os custos da passagem e da transformação, através de cirurgias em clínicas clandestinas. 
Os aliciadores, segundo Marinho, enganavam os jovens com promessas de dinheiro fácil e riqueza.Lá, eles custeavam moradia e os exploravam através da prostituição.

No município de Mulungu, por exemplo, uma rua inteira ficou conhecida como 'Rua da Itália' porque a maioria das casas é daqueles que conseguem mandam dinheiro para as famílias comprarem casas e carros, conforme Marinho.
"Já está se criando entre as crianças pobres da cidade uma ilusão que as faz presas fáceis para os aliciadores. Ao serem perguntadas sobre o que algumas querem ser quando crescer elas são enfáticas em responder: quero dar o 'c' na Itália para ganhar dinheiro e comprar casa e carro para minha família", contou Marinho.
O lucro exorbitante e o exibicionismo dos aliciadores são usados para seduzir e convencer as vítimas que facilmente são levadas para uma realidade bem diferente daquela que imaginavam. 
"Para dar o retorno financeiro aos criminosos, as vítimas precisam fazer pelo menos 13 programas por noite. O  que dá um lucro estimado de mil e 700 euros. "Por ano, eles fazem cerca de 500 mil euros, ou seja, mais de R$ 1 milhão", calculou o promotor. Porém grande parte do dinheiro fica com os cafetões e aliciadores. 
Os criminosos é quem conseguem 'se dar bem'. Eles voltam à Paraíba e compram fazendas, carros, supermercado, casas lotéricas, farmácias e casas de praia. "Uma coisa que nos deixou desconfiados foi o fato deles voltarem com homens italianos que chamam de maridos e que controlam as finanças e o investimento deles", disse Marinho.
Para a maioria dos jovens aliciados, resta a exploração. Eles são levados para cidades como Roma, Milão e Gênova e lá ficam morando em verdadeiros guetos sem poder circular pelas cidades. Eles só saeam à noite para 'trabalhar' e têm que pagar o investimento feito neles.  Vivem fugindo da Polícia e são usados muitas vezes como mulas para traficar drogas entre as cidades italianas. "Os que se arriscam a transar sem camisinha e a usar drogas durante os atos sexuais ganham mais", contou.
Ocorrem também brigas entre os jovens pelos pontos de prostituição. E quando o sonho vira pesadelo, e os jovens são vítimas de doenças, depressão e da perseguição policial, eles voltam decadentes e com as mãos 'abanando'. "Isso quando não morrem", disse.
Marinho revelou ainda que chegou ao seu conhecimento a morte de pelo menos três vítimas. Uma, conhecida como Scarlet, teria sido assassinada na Itália. Outra vítima teria morrido atropelada e uma terceira morreu após o silicone que foi implantado nas nádegas ter descido para as pernas. O promotor soube também de vítimas que contraíram aids e foram descartadas pelos cafetões. "É uma situação muito triste".
A Polícia Federal instaurou inquérito e conseguiu provas contra o grupo através de quebra de sigilo bancário e gravações telefônicas.
Da rede investigada e denunciada à Justiça da Paraíba e que atuou de 1999 até 2007, em municípios da Região do Brejo, o considerado o líder da quadrilha, Isnard Alves  Cabral, que fixou residência na Itália, foi preso por ações ilícitas naquele país.
Na Paraíba, o processo tramita em sigilo na 3ª Vara da Justiça Federal, com sede em João Pessoa.
Diligências
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o tráfico de pessoas no Brasil vai fazer diligências nos Estados de São Paulo, Pará, Pernambuco, Paraíba e Rio de Janeiro, além de visitas aos países de Suriname e Guiana Francesa.

A Paraíba foi incluída nas diligências após apresentações de dados pesquisados pelo professor adjunto do Centro de Ciências Jurídicas da UFPB, Sven Peterker. "Peterker depôs na CPI, revelando que travestis são aliciados no interior da Paraíba e obrigados a fazer cirurgias de forma artesanal e insegura para depois viajarem para a Itália. Mas não é só isso, ele também apontou a exploração sexual de crianças e adolescentes, os trabalhos escravo nas fazendas e domésticos como crimes que têm relação com o comércio de pessoas no estado”, relatou o vice-presidente da CPI, deputado federal Luiz Couto (PT/PB).

CPI

A Comissão Parlamentar de Inquérito é destinada a investigar o tráfico de pessoas no Brasil, suas causas, consequências e responsáveis no período de 2003 a 2011, compreendido na vigência da Convenção de Palermo.

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