Caso se confirmem as 39 mortes confessadas em
Goiânia, segundo a polícia, pelo vigilante Tiago Henrique Gomes da Rocha, o
brasileiro estará entre os serial killers mais letais da história moderna. É o
que afirma o professor de criminologia americano Scott Bonn, da Universidade
Drew, em Nova Jersey (EUA).
A polícia de Goiânia
diz que Rocha, de 26 anos, cometeu os crimes a partir de 2011. Entre suas
vítimas estão moradores de rua, homens gays e jovens mulheres. Rocha foi preso
na semana passada numa operação policial.
"Isso (o total de
vítimas) o colocaria no topo do ranking, ao lado dos mais prolíficos serial
killers da história moderna", disse Bonn à BBC Brasil.
Bonn, autor do livro
"Why We Love Serial Killers" (Por Que Amamos Serial Killers", em
tradução livre), a ser lançado na próxima semana, compara o brasileiro a
psicopatas americanos que ficaram célebres por seus crimes.
"Ele parece ser um
psicopata, como Ted Bundy, John Wayne Gacy, Dennis Rader ou Gary Ridgway, que
foram alguns dos mais prolíficos serial killers da história americana",
diz Bonn.
Psicopatas
Acredita-se que Ted
Bundy, executado em 1989, tenha estuprado e assassinado pelo menos 36 mulheres
nos anos 1970. Considerado bonito e extremamente carismático, ele atraía suas
vítimas muitas vezes fingindo algum tipo de ferimento e pedindo ajuda.
Diferentemente de Tiago, Bundy não usava armas de fogo, preferindo golpear ou
estrangular suas vítimas.
John Wayne Gacy
torturou, violentou e assassinou pelo menos 33 rapazes nos anos 1970. Ele era
considerado um membro exemplar da comunidade, inclusive se vestindo de palhaço
em eventos beneficentes para arrecadar fundos para caridade, o que o tornou
conhecido como "o Palhaço Assassino".
Dennis Rader torturou e
matou dez homens e mulheres de diferentes idades entre os anos 1970 e 1990 no
Estado do Kansas. Ele costumava enviar cartas à polícia e a jornais detalhando
seus crimes. Já Gary Ridgway foi condenado por matar 49 mulheres a partir dos
anos 1980, mas acredita-se que o número de vítimas possa passar de 90.
"Todos eles eram
completos psicopatas, e só foram pegos porque acabaram cometendo algum
erro", observa Bonn.
O Brasil também já teve
outros casos célebres de serial killers, como Pedro Rodrigues Filho, o
"Pedrinho Matador", acusado de mais de 70 mortes, entre elas a do
próprio pai, e Francisco das Chagas Rodrigues de Brito, que estuprou, matou e
castrou 42 meninos no Maranhão e no Pará entre 1991 e 2003.
Missão
O criminologista
ressalta que, assim como Rocha, os psicopatas americanos mencionados por ele
levavam vidas aparentemente normais, sem despertar suspeitas.
Vizinhos e colegas de
Rocha se declararam surpresos com a revelação dos crimes. Seus empregadores
afirmaram que até então a conduta do vigilante no ambiente de trabalho era
"irrepreensível".
"Psicopatas usam
máscaras, conseguem fingir ser perfeitamente normais. Sabem qual a coisa
correta a dizer e a fazer em cada situação. Eles não sentem emoções, mas são
muito bons em fingir emoções. Conseguem se camuflar, como um camaleão",
diz Bonn.
Bonn salienta que
psicopatas não são doentes mentais. "É um transtorno de personalidade.
Esses indivíduos são capazes de compartimentalizar suas vidas. Ele (Rocha)
trabalhava em um hospital, poderia parecer um cara legal. Mas tinha esse alter
ego", afirma.
Leia mais: Serial
killer mais famoso da Suécia pode não ter matado ninguém
A escolha das vítimas
feita por Rocha, que diz ter matado homossexuais e pelo menos oito moradores de
rua, leva o especialista a classificar o brasileiro em uma categoria de serial
killers definida como "mission killers", ou assassinos com uma
missão.
"É alguém que
imagina, em sua mente perturbada, estar fazendo um bem para a sociedade. É uma
forma de racionalizar seus crimes", afirma.
Bonn lembra o caso do
ex-fuzileiro naval Itzcoatl Ocampo, acusado de uma série de assassinatos em Los
Angeles entre 2011 e 2012, cujas vítimas principais eram moradores de rua.
"Ele estava
revoltado porque havia sido treinado para ser um atirador de elite no Iraque,
mas nunca pode colocar isso em prática. Então, decidiu livrar a sociedade dos
moradores de rua."
Rejeição e abuso
O ex-advogado de Rocha
revelou que seu cliente havia sofrido abuso sexual na infância e bullying na
escola.
Para Bonn, é provável
que esse tipo de experiência tenha deixado no brasileiro um sentimento de
raiva.
"(Os crimes) eram
sua maneira de canalizar essa raiva. Ele sentia que havia sido abusado pela
sociedade e encontrou uma maneira de revidar", diz.
O criminologista
observa que no caso dos assassinatos de mulheres atribuídos a Rocha, há
indícios de que os crimes não tenham tido motivação diretamente sexual.
Desde janeiro deste
ano, pelo menos 15 mulheres foram assassinadas a tiros em Goiânia por um
motociclista com o rosto coberto. Agora, acredita-se que Rocha seja o autor
desses crimes.
"O fato de que ele
atirou contra elas à distância indica que não há um componente sexual para
esses crimes, que tinham outra motivação. E suspeito que seja porque ele
simplesmente tinha raiva de mulheres, por ter sido rejeitado quando era mais
jovem", afirma.
Segundo os policiais
que trabalham no caso, Rocha teria dito que sofreu traições e desilusões
amorosas. O suspeito também teria demonstrado desconforto com a presença de
mulheres durante seus depoimentos.
Além dos assassinatos,
Rocha é investigado por cerca de 90 roubos. Ao ser preso, ele pediu ajuda
médica.
Bonn salienta, porém,
que não existe cura para um psicopata. "Tipicamente, psicopatas são
isolados nas prisões e podem aprender a obedecer as regras e até se tornarem
prisioneiros modelos. Mas não há cura."
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