A história do cidadão
morto do coração durante o sexo habita o mundo dos mitos, afirma o médico do
exercício e do esporte Claudio Gil Araújo, um dos autores do estudo e professor
visitante sênior do Instituto do Coração da UFRJ. Isto porque sexo é
maravilhoso e essencial, mas se trata de um exercício de baixíssima
intensidade. Tanto para homens quanto para mulheres.
Os batimentos cardíacos
disparam de fato durante os momentos mais intensos, mas estes duram tão pouco
se comparados com outros exercícios que não matam ninguém do coração — ou só
alguns raríssimos desafortunados.
— O gasto energético do
sexo é baixíssimo. Em qualquer relação, a etapa mais intensa, o ápice da
penetração, não dura muito mais do que cinco minutos. Em geral, menos. E o
orgasmo, que é o clímax, leva em média de dez a 30 segundos. Isso é muito pouco
tempo para matar alguém — afirma Araújo.
VANTAGEM DE SER ATIVO
Se o sexo não altera os
níveis de sedentarismo de ninguém, ser ativo fisicamente melhora o desempenho
sexual.
— O sexo é essencial, e
positivo sob todos os aspectos. Mas é um exercício de baixíssima intensidade.
Mas, claro, quem está em boa forma faz sexo melhor — observa o médico.
Um indivíduo bem
condicionado faz melhor sexo, pelo menos no que diz respeito à resistência,
força e flexibilidade. Mas alguém que faça sexo todos os dias e por muitas
horas não se torna mais atlético por isso.
Araújo e os colegas
Ricardo Stein, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Aline Sardinha,
da UFRJ, fizeram a pesquisa para subsidiar a orientação de pacientes cardíacos.
— Muitos cardiopatas
são erroneamente orientados a não fazer sexo. Na verdade, apenas pacientes de
altíssimo risco cardíaco, e mesmo assim, muitas vezes, apenas por algum tempo,
devem evitar o intercurso sexual. Beijos e toques não são proibidos para
ninguém — declara Araújo.
Intitulada “Atividade
sexual e pacientes cardíacos: uma perspectiva contemporânea”, a pesquisa foi
publicada na revista científica “Canadian Journal of Cardiology”. Os cientistas
analisaram 130 trabalhos científicos sobre vários aspectos da sexualidade e, em
particular, o risco de morte súbita durante a atividade sexual. Descobriram não
só que ela é mais mito do que realidade, como desencavaram a obscura origem das
lendas urbanas.
— Ficar sem fazer sexo
é muito nocivo para o estado geral do indivíduo. É muito comum ver o paciente
de meia idade sedentário, acima do peso, fumante, que ainda por cima teve um
infarto, ser desaconselhado a fazer sexo. Isso é muito negativo. Leva à
depressão — afirma o médico.
Sexo e coração geram
mitos. Araújo e seus colegas foram descobrir no Japão dos anos 60 a origem da
crença de que sexo extraconjugal é mais perigoso para o coração. Pode ser mais
perigoso para o casamento. Mas não para a saúde. O estudo que suscitou essa
crença foi realizado com um pequeno número de frequentadores de casas de
gueixas e não houve comparação com outros tipos de relacionamento.
— Na verdade, esse
estudo é muito citado e quase não foi lido. Só existe em japonês, não está
on-line e praticamente desapareceu. A pesquisa em si era muito superficial. Mas
a lenda que gerou perdura até hoje — comenta Araújo.
RESTRIÇÕES TEMPORÁRIAS
Outro mito é a comparação
com o esforço de subir escadas.
— Há quem acredite que
fazer sexo equivale a subir três lances de escada. Não sei bem de onde saiu
esta ideia. Mas uma relação sexual, no que diz respeito a gasto de energia,
está mais para uma caminhada. E isso não tem muito a ver com a criatividade das
posições adotadas — salienta.
Segundo ele, a verdade
é que a chance de morte durante a atividade sexual é muito pequena, mesmo para
cardíacos. Podem existir restrições temporárias:
— Morrer durante uma
atividade física já é incomum. E menos de 2% das mortes associadas a atividades
físicas aconteceram durante o ato sexual. E isso para os homens. Para as
mulheres, é quase zero.
O estudo indica que
mesmo pacientes com pontes de safena, stents e angina podem retomar a atividade
sexual, se medicados e bem orientados por médico.